Luis de Camoes Collected Poetical Works

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Luis de Camoes Collected Poetical Works Page 53

by Luis de Camoes


  Ser esta vida cousa tão pequena.

  “‘Thee from a chosen host have chosen I 79

  the dangers claimed by thee to undergo:

  ’Tis heavy travail, hard, heroick, high;

  which love of me shall lighten, well I trow.’

  I could not suffer more:—’ Great King!’ I cry,

  ‘ to face the steel-clad host, sword, lance, fire, snow,

  for thee were thing so slight, my sole annoy

  is to see trivial life so vain a toy.

  80

  — “Imaginai tamanhas aventuras,

  Quais Euristeu a Alcides inventava,

  O leão Cleoneu, Harpias duras,

  O porco de Erimanto, a Hidra brava,

  Descer enfim às sombras vãs e escuras

  Onde os campos de Dite a Estige lava;

  Porque a maior perigo, a mor afronta,

  Por vós, ó Rei, o espírito e a carne é pronta.”

  “‘Imagine ev’ery wildest aventure, 80

  such as Eurystheus for Alcides plan’d:

  Cleone’s Lyon, Harpies foul and dour,

  and Boar of Erymanth and Hydra ban’d;

  in fine to seek those empty shades obscure

  where Styx surrounds of Dis the dire Dead-land;

  the greatest danger and the deadliest brunt,

  for thee, O King! this soul, this flesh would front.’

  81

  “Com mercês sumptuosas me agradece

  E com razões me louva esta vontade;

  Que a virtude louvada vive e cresce,

  E o louvor altos casos persuade.

  A acompanhar-me logo se oferece,

  Obrigado d’amor e d’amizade,

  Não menos cobiçoso de honra e fama,

  O caro meu irmão Paulo da Gama.

  “His thanks and costly gifts on me bestows 81

  the King, whose reason lauds my ready will;

  for Valour fed on praises lives and grows,

  Praise is the noble Spirit’s spur and spell.

  At once to share my fortunes doth propose,

  whom friendship and fraternal love compel,

  nor less resolved to win him name and fame, a

  dear trusty brother named Paul da Gama.

  82

  “Mais se me ajunta Nicolau Coelho,

  De trabalhos mui grande sofredor;

  Ambos são de valia e de conselho,

  De experiência em armas e furor.

  Já de manceba gente me aparelho,

  Em que cresce o desejo do valor;

  Todos de grande esforço; e assim parece

  Quem a tamanhas cousas se oferece.

  “Eke Nicholas Coelho volunteers, 82

  trained to toilsome tasks and sufferings long;

  both are in valour and in counsel peers,

  in arms experienced, and in battle strong.

  Now choicest hands in Youthtide’s gen’erous years,

  lusting for Bravery’s meed around me throng;

  doughty, high-mettled, as doth best become

  advent’urous manhood that would tempt such doom.

  83

  “Foram de Emanuel remunerados,

  Porque com mais amor se apercebessem,

  E com palavras altas animados

  Para quantos trabalhos sucedessem.

  Assim foram os Mínias ajuntados,

  Para que o Véu dourado combatessem,

  Na fatídica Nau, que ousou primeira

  Tentar o mar Euxínio, aventureira.

  “All these by Man’oel’s hand remun’erate were, 83

  that Love through Duty might the more increase;

  and with high words each heart was fired to bear

  adventures, peradventure, sans surcease.

  Thus did the Minyae for their feat prepare, —

  to gain the glories of the Golden Fleece, —

  orac’ulous Argo-ship, that dared the first

  through Euxine waves her vent’urous way to burst.

  84

  “E já no porto da ínclita Ulisseia

  C’um alvoroço nobre, e é um desejo,

  (Onde o licor mistura e branca areia

  Co’o salgado Neptuno o doce Tejo)

  As naus prestes estão; e não refreia

  Temor nenhum o juvenil despejo,

  Porque a gente marítima e a de Marte

  Estão para seguir-me a toda parte.

  “Now in famed Ulyssea’s haven man’d, 84

  with raptures worthy of the great design

  (where his sweet liquor and his snowy sand

  our Tagus blendeth with Neptunian brine),

  ride the ships ready. Here my strong young band

  by fear unbridled glad in labour join;

  for those of Mars and Neptune, one and all,

  the world would wander did I only call.

  85

  “Pelas praias vestidos os soldados

  De várias cores vêm e várias artes,

  E não menos de esforço aparelhados

  Para buscar do inundo novas partes.

  Nas fortes naus os ventos sossegados

  Ondeam os aéreos estandartes;

  Elas prometem, vendo os mares largos,

  De ser no Olimpo estrelas como a de Argos.

  “Fast by the foreshore comes the soldiery 85

  in various colours prankt with various art;

  nor less enforced by inner force are they

  to seek and see Earth’s unexplored part.

  Round the good Navy gentle breezes play

  and blithely waves each airy estandart:

  They swear, far-gazing on the breadth of brine,

  ‘mid stars Olympick Argo-like to shine.

  86

  “Depois de aparelhados desta sorte

  De quanto tal viagem pede e manda,

  Aparelhamos a alma para a morte,

  Que sempre aos nautas ante os olhos anda.

  Para o sumo Poder que a etérea corte

  Sustenta só coa vista veneranda,

  Imploramos favor que nos guiasse,

  E que nossos começos aspirasse.

  “When all prepared according to this sort 86

  with what of wants such lengthy way demandeth,

  our souls we did prepare for Death’s disport

  who before seaman’s eyne for ever standeth:

  To the Most Highest, throned in Heaven’s court

  which He sustains, whose glance this globe

  commandeth, that He, our guard and guide, His aidance lend,

  we prayed, and see our incept to its end.

  87

  “Partimo-nos assim do santo templo

  Que nas praias do mar está assentado,

  Que o nome tem da terra, para exemplo,

  Donde Deus foi em carne ao mundo dado.

  Certifico-te, ó Rei, que se contemplo

  Como fui destas praias apartado,

  Cheio dentro de dúvida e receio,

  Que apenas nos meus olhos ponho o freio.

  “Thus we departed from the saintly Shrine 87

  built on the margent of the briny wave,

  named, for all mem’ory, from the Land Divine,

  where God incarned came the world to save.

  King! I assure thee when this mind of mine

  rememb’ereth how ’twas ours those shores to leave,

  filled are my sprite and heart with doubts and fears,

  and eyes can hardly stay their trickling tears.

  88

  “A gente da cidade aquele dia,

  (Uns por amigos, outros por parentes,

  Outros por ver somente) concorria,

  Saudosos na vista e descontentes.

  E nós coa virtuosa companhia

  De mil Religiosos diligentes,

  Em procissão solene a Deus orando,

  Para os batéis viemos caminhando.

  “The City-people on that saddest day 88

  (these for their bosom-friends, and thos
e for kin,

  and others but spectators) thronged the way

  sad and down-hearted at the dreary scene:

  We, winding through the virtuous array

  a thousand monks and priests of rev’erend mien,

  praying, in solemn pageant, to the Lord,

  afoot set forth the ready barques to board.

  89

  “Em tão longo caminho e duvidoso

  Por perdidos as gentes nos julgavam;

  As mulheres c’um choro piedoso,

  Os homens com suspiros que arrancavam;

  Mães, esposas, irmãs, que o temeroso

  Amor mais desconfia, acrescentavam

  A desesperarão, e frio medo

  De já nos não tornar a ver tão cedo.

  “On such long dubious courses sent to steer, 89

  us deemed the people den’izens of the tomb;

  the wailing women shed the piteous tear,

  and sadly sighed the men to sight our doom:

  Wives, sisters, mothers (most their hearts must fear

  whose love is foremost) added to the gloom

  Despair; and shudder’d with a freezing fright

  lest we, their loved ones, aye be lost to sight.

  90

  “Qual vai dizendo:—”Ó filho, a quem eu tinha

  Só para refrigério, e doce amparo

  Desta cansada já velhice minha,

  Que em choro acabará, penoso e amaro,

  Por que me deixas, mísera e mesquinha?

  Por que de mim te vás, ó filho caro,

  A fazer o funéreo enterramento,

  Onde sejas de peixes mantimento!” —

  “This, following, saith: ‘O son! I ever held 90

  coolth of my sorrows and the sweet relief

  of mine already weary way-worn eld

  so soon to sink in glooms of need and grief;

  why leave me thus to want and woe compel’d?

  Why fly my love, fond child? whose days so brief

  shall set in darkness, and in briny grave

  shalt feed the fishes of the greedy wave.

  91

  “Qual em cabelo:—”Ó doce e amado esposo,

  Sem quem não quis Amor que viver possa,

  Por que is aventurar ao mar iroso

  Essa vida que é minha, e não é vossa?

  Como por um caminho duvidoso

  Vos esquece a afeição tão doce nossa?

  Nosso amor, nosso vão contentamento

  Quereis que com as velas leve o vento?” —

  “That, with loosed locks: ‘O douce and dearest 91 spouse,

  lacking whose love Love willeth not I live;

  why risk, when daring Ocean’s wrath to rouse,

  thy life, my life which is not thine to give?

  How canst forget our fond fair marriage-vows?

  Why face the waves a homeless fugitive?

  Our love, our vain content shall nought avail

  thrown to the breezes as they blow the sail?’

  92

  “Nestas e outras palavras que diziam

  De amor e de piedosa humanidade,

  Os velhos e os meninos os seguiam,

  Em quem menos esforço põe a idade.

  Os montes de mais perto respondiam,

  Quase movidos de alta piedade;

  A branca areia as lágrimas banhavam,

  Que em multidão com elas se igualavam.

  “With such and sim’ilar words that spake the tongue 92

  of love and human nature’s yearning woe,

  followed our seaward path both old and young,

  life’s two extremes by Time made weak and slow.

  Sad Echo wailed the near wolds among,

  as though hard hills were moved grief to show

  And tears the snowy shore suchwise bedew’d,

  drops rivall’d sands in equal multitude.

  93

  “Nós outros sem a vista alevantarmos

  Nem a mãe, nem a esposa, neste estado,

  Por nos não magoarmos, ou mudarmos

  Do propósito firme começado,

  Determinei de assim nos embarcarmos

  Sem o despedimento costumado,

  Que, posto que é de amor usança boa,

  A quem se aparta, ou fica, mais magoa.

  “Of us the Company, ne’er raising eye 93

  on wife or mother, marcht in such a state,

  we feared our hearts fall faint, and fain we fly

  our fixt resolves, repenting all too late:

  Thus I determined straight aboard to hie,

  sans ‘Fare-thee-wells’ by custom consecrate;

  which, though they be dear love’s own lovely way,

  redouble grief to those who go or stay.

  94

  “Mas um velho d’aspeito venerando,

  Que ficava nas praias, entre a gente,

  Postos em nós os olhos, meneando

  Três vezes a cabeça, descontente,

  A voz pesada um pouco alevantando,

  Que nós no mar ouvimos claramente,

  C’um saber só de experiências feito,

  Tais palavras tirou do experto peito:

  “But now an aged Sire of reverend mien, 94

  upon the foreshore thronged by the crowd,

  with eyne fast fixt upon our forms was seen,

  and discontented thrice his brow he bow’d:

  His deep toned accents raising somewhat keen,

  that we from shipboard hear him speak aloud,

  with lore by long experience only grown,

  thus from his time-taught breast he made his moan: —

  95

  —”Ó glória de mandar! Ó vã cobiça

  Desta vaidade, a quem chamamos Fama!

  Ó fraudulento gosto, que se atiça

  C’uma aura popular, que honra se chama!

  Que castigo tamanho e que justiça

  Fazes no peito vão que muito te ama!

  Que mortes, que perigos, que tormentas,

  Que crueldades neles experimentas!

  “‘Oh craving of Command! Oh vain Desire! 95

  of vainest van’ity man miscalleth Fame!

  Oh fraudulent gust, so easy fanned to fire

  by breath of vulgar, aping Honour’s name!

  What just and dreadful judgment deals thine ire,

  to seely souls who overlove thy claim!

  What deaths, what direful risks, what agonies

  wherewith thou guerd’onest them, thy fitting prize!

  96

  — “Dura inquietação d’alma e da vida,

  Fonte de desamparos e adultérios,

  Sagaz consumidora conhecida

  De fazendas, de reinos e de impérios:

  Chamam-te ilustre, chamam-te subida,

  Sendo dina de infames vitupérios;

  Chamam-te Fama e Glória soberana,

  Nomes com quem se o povo néscio engana!

  “‘ Thou dour disturber of man’s sprite and life, 96

  fount of backsliding and adultery,

  sagacious waster, and consummate thief

  of subjects, kingdoms, treasure, empery:

  They hail thee noble, and they hail thee chief,

  though digne of all indignities thou be;

  they call thee Fame and Glory sovereign,

  words, words, the heart of silly herd to gain!

  97

  — “A que novos desastres determinas

  De levar estes reinos e esta gente?

  Que perigos, que mortes lhe destinas

  Debaixo dalgum nome preminente?

  Que promessas de reinos, e de minas

  D’ouro, que lhe farás tão facilmente?

  Que famas lhe prometerás? que histórias?

  Que triunfos, que palmas, que vitórias?

  “‘What new disaster dost thou here design? 97

  What horror for our realm and race invent?

  What unheard dangers or what deaths condign,

&n
bsp; veiled by some name that soundeth excellent?

  What bribe of gorgeous reign, and golden mine,

  whose ready offer is so rarely meant?

  What Fame hast promised them? what pride of story?

  What palms? what triumphs? what victorious glory?

  98

  — “Mas ó tu, geração daquele insano,

  Cujo pecado e desobediência,

  Não somente do reino soberano

  Te pôs neste desterro e triste ausência,

  Mas inda doutro estado mais que humano

  Da quieta e da simples inocência,

  Idade d’ouro, tanto te privou,

  Que na de ferro e d’armas te deitou:

  “‘But oh! race ‘gendered by his sin insane, 98

  whom disobedience of the high command,

  not only chased from the heav’enly reign,

  and doomed to distant and exited land;

  but, eke, from other state too blest for men

  where Peace with Innocence fared hand in hand,

  that olden golden Age, his victims hurl’d

  into an iron and an armed world:

  99

  — “Já que nesta gostosa vaidade

  Tanto enlevas a leve fantasia,

  Já que à bruta crueza e feridade

  Puseste nome esforço e valentia,

  Já que prezas em tanta quantidades

  O desprezo da vida, que devia

  De ser sempre estimada, pois que já

  Temeu tanto perdê-la quem a dá:

  “‘Since by this gustful Van’ity led astray, 99

  lighter thou makest man’s light phantasy;

  since his brute fierceness and his lust of prey

  bear honoured names of Strength and Valiancy;

  since thou wilt price and prize, in wildest way,

  despisal of man’s life, which aye should be

  esteemed of mortals, nay, held doubly dear,

  when He who gave it, gave it up with fear:

  100

  — “Não tens junto contigo o Ismaelita,

  Com quem sempre terás guerras sobejas?

  Não segue ele do Arábio a lei maldita,

  Se tu pela de Cristo só pelejas?

  Não tem cidades mil, terra infinita,

  Se terras e riqueza mais desejas?

  Não é ele por armas esforçado,

  Se queres por vitórias ser louvado?

  “‘Neighbours thee not the hateful Ishmaelite, 100

  with whom abundant strife shalt ever hold?

  Follows he not th’ Arabian’s law unright,

  an thou wouldst fight to fill of CHRIST the fold?

  A thousand cities, regions infinite,

  are they not his, an cov’etest earth and gold?

  Is he not strong in warfare, high in name,

  if Honour be, not greed of gain, thine aim?

  101

  — “Deixas criar às portas o inimigo,

  Por ires buscar outro de tão longe,

  Por quem se despovoe o Reino antigo,

  Se enfraqueça e se vá deitando a longe?

 

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