E rudos paus tostados sós farão
O que arcos e pelouros não fizeram.
Ocultos os juízos de Deus são;
As gentes vãs, que não nos entenderam,
Chamam-lhe fado mau, fortuna escura,
Sendo só providência de Deus pura.
“There salvage Caffres shall have pow’er to do 38
what ne’er could do the pow’er of dext’erous foe;
and the rude fire-charred club and staff subdue
whom ne’er subdued ball nor artful bow.
Forsooth His judgments hide from human view!
Vain fools who vainly judge what none may know,
call a misfortune, term a fate malign,
what is but Prov’idence pure, all-wise, divine.
Then waxt the woeful wail a sorer strain, 38a
“Oh, God, what vision in the further days!
That fair young Prince of Gaul’s imperial vein,
so knightly valiant, fain of fame and praise:
I see him fighting, stricken, fallen, slain,
pierced in front by Cafire assegais: —
Blush, Albion! blush, when Britons dare to flee
and leave such Prince such obscure doom to dree!”
39
“Mas oh, que luz tamanha que abrir sinto
(Dizia a Ninfa, e a voz alevantava)
Lá no mar de Melinde, em sangue tinto
Das cidades de Lamo, de Oja e Brava,
Pelo Cunha também, que nunca extinto
Será seu nome em todo o mar que lava
As ilhas do Austro, e praias que se chamam
De São Lourenço, e em todo o Sul se afamam!
“But, oh! what lustrous Light illumes mine eyes,” 39
resumed the Nymph, as rose again her tone,
“there where Melinde’s blood-dyed Ocean lies
from Lamo, Oja, Brava-town, o’erthrown
by hand of Cunha, such a deed ne’er dies,
o’er farthest seas his name shall aye be known
that lave those Austral Islands, and the shore
Saint Lawrence hight and ring the wide world o’er.
40
“Esta luz é do fogo e das luzentes
Armas com que Albuquerque irá amansando
De Ormuz os Párseos, por seu mal valentes,
Que refusam o jugo honroso e brando.
Ali verão as setas estridentes
Reciprocar-se, a ponta no ar virando
Contra quem as tirou; que Deus peleja
Por quem estende a fé da Madre Igreja.
“This Light is glance and glare of lucent arm 40
wherewith your Albuquerque’s hand shall tame
the Hormuz Parsi’s heart which be his harm,
refusing gentle rule as yoke of shame.
There shall he see of shafts the strident swarm,
in air revolving with recurved aim
upon his archer, for our God shall aid,
who holy faith of Mother Church would spread.”
41
“Ali do sal os montes não defendem
De corrupção os corpos no combate,
Que mortos pela praia e mar se estendem
De Gerum, de Mazcate e Calaiate;
Até que à força só de braço aprendem
A abaxar a cerviz, onde se lhe ate
Obrigação de dar o reino inico
Das perlas de Barém tributo rico.
“There the Salt Mountains never shall defend 41
corruption from remains of men that met
War’s doom, and o’er the seas and shores extend
of Gerum Isle, Maskat and Calayat:
Till by pure force of arms they learn to bend
the subject neck, and pay the scot of Fate:
Compulsion sore this wicked Reign shall vex
and tithe of pearl that Barem’s oyster decks.
42
“Que gloriosas palmas tecer vejo
Com que Vitória a fronte lhe coroa,
Quando, sem sombra vã de medo ou pejo,
Toma a ilha ilustríssima de Goa!
Despois, obedecendo ao duro ensejo,
A deixa, e ocasião espera boa
Com que a torne a tomar, que esforço e arte
Vencerão a Fortuna e o próprio Marte.
“What wreaths of glorious Palms I see them weave 42
wherewith by Victory’s hand his head is crown’d;
when he sans shade of fear or shame shall reave
illustrious Goa’s Island world-renown’d.
See, forced by Need’s hard law his prize to leave,
he seeks new favouring chance; and, soon as found,
the taken he retakes; such Arm and Art
shall conquer Fortune and the self of Mart.
43
“Eis já sobr’ela torna e vai rompendo
Por muros, fogo, lanças e pelouros,
Abrindo com a espada o espesso e horrendo
Esquadrão de Gentios e de Mouros.
Irão soldados ínclitos fazendo
Mais que liões famélicos e touros,
Na luz que sempre celebrada e dina
Será da Egípcia Santa Caterina.
“Lo! he returns and bursts what dares oppose, 43
thro’ bullet, lance-plump, steel, fire, strongest hold;
breaks with his brand the squadded host of foes,
the serried Moor, the Gentoo manifold.
His inclyt sold’iery more of fury shows
than rampant Bulls, or Lyons hunger-bold,
that Day for ever celebrate and digne
of Egypt’s Martyr-maid, Saint Catherine.
44
“Nem tu menos fugir poderás deste,
Posto que rica e posto que assentada
Lá no grémio da Aurora, onde naceste,
Opulenta Malaca nomeada.
As setas venenosas que fizeste,
Os crises com que já te vejo armada,
Malaios namorados, Jaus valentes,
Todos farás ao Luso obedientes.”
“Nor shalt thou ‘scape the fate to fall his prize 44
albeit so wealthy, and so strong thy site
there on Aurora’s bosom, whence thy rise,
thou Home of Opulence, Malacca hight!
The poysoned arrows which thine art supplies
the Krises thirsting, as I see, for fight,
th’ enamoured Malay-men, the Javan braves,
all of the Lusian shall become the slaves.”
45
Mais estanças cantara esta Sirena
Em louvor do ilustríssimo Albuquerque,
Mas alembrou-lhe üa ira que o condena,
Posto que a fama sua o mundo cerque.
O grande Capitão, que o fado ordena
Que com trabalhos glória eterna merque,
Mais há-de ser um brando companheiro
Pera os seus, que juiz cruel e inteiro.
She had more stanzas sung in Siren-strain, 45
lauding her Albuquerque’s high renown,
when she recalled the pass’ionate deed, the stain
on his white fame that o’er the world hath shone.
The mighty Captain whom the Fates ordain
to view his toils win Glory’s lasting Crown,
should ever ‘prove him kind and loved compeer
of his own men, not cruel judge severe.
46
Mas em tempo que fomes e asperezas,
Doenças, frechas e trovões ardentes,
A sazão e o lugar, fazem cruezas
Nos soldados a tudo obedientes,
Parece de selváticas brutezas,
De peitos inumanos e insolentes,
Dar extremo suplício pela culpa
Que a fraca humanidade e Amor desculpa.
In days of hunger and of dire distress, 46
sickness, bolts, arrows, thunder, lightning-glint,
when the sore seasons and sad sites oppressr />
his soldiers, rendering services sans stint;
it seemeth salvage act of wild excess,
of heart inhuman, bosom insolent,
to make last penalty of Laws atone
for sins our frailty and our love condone.
47
Não será a culpa abominoso incesto
Nem violento estupro em virgem pura,
Nem menos adultério desonesto,
Mas cüa escrava vil, lasciva e escura.
Se o peito, ou de cioso, ou de modesto,
Ou de usado a crueza fera e dura,
Cos seus üa ira insana não refreia,
Põe na fama alva noda negra e feia.
Abominable incest shall not be 47
his sin, nor ruffian rape of virgin pure,
not e’en dishonour of adultery,
but lapse with wanton slave-girl, vile, obscure:
If urged by jealous sting, or modesty,
or used to cruelty and harshness dour,
Man from his men mad anger curbeth not,
his Fame’s white shield shall bear black ugly blot.
48
Viu Alexandre Apeles namorado
Da sua Campaspe, e deu-lha alegremente,
Não sendo seu soldado exprimentado,
Nem vendo-se num cerco duro e urgente.
Sentiu Ciro que andava já abrasado
Araspas, de Panteia, em fogo ardente,
Que ele tomara em guarda, e prometia
Que nenhum mau desejo o venceria;
Learnt Alexander that Apelles loved 48
and his Campaspe gave with glad consent,
though was the Painter not his Soldier proved,
nor in hard urgent siege his force was pent.
Felt Cyrus, eke, Panthe’a deeply moved
Araspas, by the fire of Passion brent,
though he had tane her charge, and pledged his oath
dishonest love should never break his troth:
49
Mas, vendo o ilustre Persa que vencido
Fora de Amor, que, enfim, não tem defensa,
Levemente o perdoa, e foi servido
Dele num caso grande, em recompensa.
Per força, de Judita foi marido
O férreo Balduíno; mas dispensa
Carlos, pai dela, posto em causas grandes,
Que viva e povoador seja de Frandes.
But see’ing the noble Persian ‘slaved and sway’d 49
by pow’er of Passion, sans in fine defence,
he gives light pardon, and thus gained his aid in gravest case, the fittest recompense.
Himself perforce the mate of Judith made
Baldwin hight “Bras-de-fer,” but his offence
her father, Charles, for troublous times condone’d,
and gave him life the Flanders’ reign to found.
50
Mas, prosseguindo a Ninfa o longo canto,
De Soares cantava, que as bandeiras
Faria tremular e pôr espanto
Pelas roxas Arábicas ribeiras:
— “Medina abominábil teme tanto,
Quanto Meca e Gidá, co as derradeiras
Praias de Abássia; Barborá se teme
Do mal de que o empório Zeila geme.
Again the Lyre its soul of musick sheds, 50
and sings the Nymph how shall Soares fly
air-windowing flags whose terror far o’erspreads
the ruddy coasted lands of Araby:
Th’ abominable town, Medina, dreads
as Meca dreads and Gida, and where lie
Abassia’s ultime shores: while Barbora fears
the fate that floodeth Zeyla-mart with tears.
51
“A nobre ilha também de Taprobana,
Já pelo nome antigo tão famosa
Quanto agora soberba e soberana
Pela cortiça cálida, cheirosa,
Dela dará tributo à Lusitana
Bandeira, quando, excelsa e gloriosa,
Vencendo se erguerá na torre erguida,
Em Columbo, dos próprios tão temida.
“And, eke, the noble Island Taproban, 51
whose ancient name ne’er fail’d to give her note,
as still she reigns superb and sovereign
by boon of fragrant tree-bark, biting-hot:
Toll of her treasure to the Lusitan
ensign shall pay, when proud and high shall float
your breezy banners from the lofty tower,
and all Columbo fear your castled power.
52
“Também Sequeira, as ondas Eritreias
Dividindo, abrirá novo caminho
Pera ti, grande Império, que te arreias
De seres de Candace e Sabá ninho.
Maçuá, com cisternas de água cheias
Verá, e o porto Arquico, ali vizinho;
E fará descobir remotas Ilhas,
Que dão ao mundo novas maravilhas.
“Sequeira, too, far sailing for the shore, 52
of Erythras, new way shall open wide
to thee, Great Empire! who canst vaunt of yore
to be Candace’s and the Sheban’s nide:
Masua that hoards in tanks her watery store,
he shall behold by Port Arquico’s side;
and send explorers to each distant isle,
till novel wonder all the world beguile.
53
“Virá despois Meneses, cujo ferro
Mais na Africa, que cá, terá provado;
Castigará de Ormuz soberba o erro,
Com lhe fazer tributo dar dobrado.
Também tu, Gama, em pago do desterro
Em que estás e serás inda tornado,
Cos títulos de Conde e d’honras nobres
Virás mandar a terra que descobres.
“Succeeds Meneze; less enfamed his sword 53
shall be in Asia than in Africk-land:
he shall chastise high Hormuz’ erring horde
and twofold tribute claim with conq’uering hand.
Thou also, Gama! shalt have rich reward
for ban of exile, when to high command
entitled, ‘County’ thou shalt be restored
to the fair region this thy Feat explored.
54
“Mas aquela fatal necessidade
De quem ninguém se exime dos humanos,
Ilustrado co a Régia dignidade,
Te tirará do mundo e seus enganos.
Outro Meneses logo, cuja idade
É maior na prudência que nos anos,
Governará; e fará o ditoso Henrique
Que perpétua memória dele fique.
“But soon that fatal Debt all flesh must pay, 54
wherefrom our Nature no exception knows,
while deckt with proudest Royalty’s array,
from Life shall reave thee and Life’s toils and woes:
Other Menezes cometh sans delay,
who few of years but much of prudence shows
in rule; right happy this Henrique’s lot
by human story ne’er to be forgot.
55
“Não vencerá somente os Malabares,
Destruindo Panane com Coulete,
Cometendo as bombardas, que, nos ares,
Se vingam só do peito que as comete;
Mas com virtudes, certo, singulares,
Vence os imigos d’alma todos sete;
De cobiça triunfa e incontinência,
Que em tal idade é suma de excelência.
“Conquer he shall not only Malabar, 55
destroy Panane and Coulete waste,
hurling the bombards, which through hurtled air
deal horrid havock on th’ opposing breast;
but, dower’d with virtues truly singular,
he deals to seven-fold Spirit-foes his hest:
Covetise with Incontinence he shall spurn, —
the highest conquest in the years that burn.
56
“Mas, despois que as Estrelas o chamarem,
Sucederás, ó forte Mascarenhas;
E, se injustos o mando te tomarem,
Prometo-te que fama eterna tenhas.
Pera teus inimigos confessarem
Teu valor alto, o fado quer que venhas
A mandar, mais de palmas coroado,
Que de fortuna justa acompanhado.
“Him, when his presence shall the stars invite 56
O Mascarenhas brave! thou shalt succeed;
and if injurious men shall rob thy right
eternal Fame I promise for thy meed!
That ev’ry hostile tongue confess thy might
and lofty valour, Fate for thee decreed
for more of Palm-wreaths shall thy glory crown,
than the Good Fortune due to thy renown.
57
“No reino de Bintão, que tantos danos
Terá a Malaca muito tempo feitos,
Num só dia as injúrias de mil anos
Vingarás, co valor de ilustres peitos.
Trabalhos e perigos inumanos,
Abrolhos férreos mil, passos estreitos,
Tranqueiras, baluartes, lanças, setas:
Tudo fico que rompas e sometas.
“Where Bintam’s reign her baleful head uprears, 57
Malaca humbling with her harmful hate,
in one short day the thousand tyrannous years
with bravest bosoms shalt avenge and ‘bate:
Inhuman travails, perils without peers,
a thousand iron reefs, and dangerous strait,
stockade and bulwark, lances, arr’owy sleet,
all shalt thou break, I swear, all shalt submit.
58
“Mas na Índia, cobiça e ambição,
Que claramente põem aberto o rosto
Contra Deus e Justiça, te farão
Vitupério nenhum, mas só desgosto.
Quem faz injúria vil e sem razão,
Com forças e poder em que está posto,
Não vence; que a vitória verdadeira
É saber ter justiça nua e inteira.
“But Inde’s Ambition, and her Lucre-lust, 58
for ever flaunting bold and brazen face
in front of God and Justice, shall disgust
thy heart, but do thine honour no disgrace.
Who works vile inj’ury with unreas’oning trust
in force, and footing lent by rank and place,
conquereth nothing, the true Conq’ueror he
who dares do naked Justice fair and free.
59
“Mas, contudo, não nego que Sampaio
Será, no esforço, ilustre e assinalado,
Mostrando-se no mar um fero raio,
Que de inimigos mil verá coalhado.
Em Bacanor fará cruel ensaio
No Malabar, pera que, amedrontado,
Despois a ser vencido dele venha
Cutiale, com quanta armada tenha.
“Yet to Sampaio will I not gainsay 59
a noble valour shown by shrewdest blows,
Luis de Camoes Collected Poetical Works Page 78