Luis de Camoes Collected Poetical Works

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Luis de Camoes Collected Poetical Works Page 64

by Luis de Camoes


  De serdes contra os vossos muito possantes.

  Georgians, Armenians, Grecians, hapless Thrace 13

  cry on your name to quell th’ unspeakable horde

  that dooms parforce their darlings to embrace

  Alcoran’s precepts (tax of blood abhor’d!):

  Prove, when you punish you inhuman race,

  the Sage’s spirit and the Soldier’s sword;

  nor covet arr’ogant praise and vainest boast

  of vaunting valour o’er a brother-host.

  14

  Mas entanto que cegos o sedentos

  Andais de vosso sangue, ó gente insana!

  Não faltarão Cristãos atrevimentos

  Nesta pequena casa Lusitana:

  De África tem marítimos assentos,

  É na Ásia mais que todas soberana,

  Na quarta parte nova os campos ara,

  E se mais mundo houvera, lá chegara.

  But while ye blindly thirst to drink the blood 14

  of your own veins, Oh hapless Race insane!

  never hath failed Christian hardihood

  in this our little household Lusitane:

  Her seats are set by Africk’s salty flood;

  she holds in Asian realms the largest Reign;

  She sows and ears o’er all the Fourth new-found;

  and there would hasten had but Earth more ground.

  15

  E vejamos entanto que acontece

  Aqueles tão famosos navegantes,

  Depois que a branda Vénus enfraquece

  O furor vão dos ventos repugnantes:

  Depois que a larga terra lhe aparece,

  Fim de suas porfias tão constantes,

  E dar novo costume e novo Rei.

  Meanwhile behold we what new chance befel 15

  the seld-seen Voyagers who Fame would earn,

  Since gentle Venus deigned the gale to quell,

  and futile furies of fierce winds to spurn;

  when they the large-spread Land’s appearance hail,

  of stubborn obst’inate toil the bound and bourne,

  and where the Saviour’s seed they wend to sow,

  enthrone new lords, new lights, new laws bestow.

  16

  Tanto que à nova terra se chegaram,

  Leves embarcações de pescadores

  Acharam, que o caminho lhe mostraram

  De Calecu, onde eram moradores.

  Para lá logo as proas se inclinaram,

  Porque esta era a cidade das melhores

  Do Malabar melhor, onde vivia

  O Rei que a terra toda possuía.

  Soon as along the stranger-shores they lay, 16

  a fragile fleet that fishing people bare

  they found, and by such guidance learnt the way

  to Calecut, whose denizens they were:

  Thither inclined the Prores without delay;

  for ’twas the City fairest ‘mid the fair

  in land of Malabar and where abode

  the King, whose orders all that Region owe’d.

  17

  Além do Indo jaz, e aquém do Gange,

  Um terreno muito grande e assaz famoso,

  Que pela parte Austral o mar abrange,

  E para o Norte o Emódio cavernoso.

  Jugo de Reis diversos o constrange

  A várias leis: alguns o vicioso

  Mahoma, alguns os ídolos adoram,

  Alguns os animais, que entre eles morri.

  Outside of Indus, inside Ganges, lies 17

  a wide-spread country famed enough of yore;

  northward the peaks of caved Emodus rise,

  and southward Ocean doth confine the shore:

  She bears the yoke of various sovranties

  and various eke her creeds: While these adore

  vicious Mafóma, those to stock and stone

  bow down, and eke to brutes among them grown.

  18

  Lá bem no grande monte, que cortando

  Tão larga terra, toda Ásia discorre,

  Que nomes tão diversos vai tomando,

  Segundo as regiões por onde corre,

  As fontes saem, donde vêm manando

  Os rios, cuja grã corrente morre

  No mar Índico, e cercam todo o peso

  Do terreno, fazendo-o Quersoneso.

  There, deep i’ the mighty Range, that doth divide 18

  the land, and cutteth Asian continent,

  whose crests are known by names diversified,

  of ev’ry country where its trend is bent;

  outburst the fountains, which commingling glide

  in pow’erful streams, that die when travel-spent

  in Indie Ocean, and the arms of these

  convert the country to a Chersonese:

  19

  Entro um e outro rio, em grande espaço,

  Sai da larga terra uma loira ponta

  Quase piramidal, que no regaço

  Do mar com Ceilão ínsula confronta;

  E junto donde nasce o largo braço

  Gangético, o rumor antigo conta

  Que os vizinhos, da terra moradores,

  Do cheiro se mantêm das finas flores.

  Twixt either river from this breadth of base 19

  puts forth the spacious land a long thin horn,

  quasi-pyramidal, which in th’ embrace

  of Ocean lies with Isle Ceylon toforn:

  And, near the source that shows the natal place

  of Gange, if olden Fame of Truth be born,

  the happy Peoples of th’ adjacent bowers,

  feed on the fragrance of the finest flowers;

  20

  Mas agora de nomes e de usança

  Novos e vários são os habitantes:

  Os Delis, os Patanes, que em possança

  De terra e gente, são mais abundantes;

  Decanis, Oriás, que a esperança

  Têm de sua salvação nas ressonantes

  Águas do Gange, e a terra de Bengala

  Fértil de sorte que outra não lhe iguala.

  But now of many usance, mode and name 20

  are all the tribes who have and hold the ground;

  Pathans and Delhis urge the proudest claim

  to land and numbers, for they most abound:

  Deccanis, Orias, who both misclaim

  salvation in the sounding flood is found

  by Ganges rolled; and here the land Bengal

  is rich in sort her wealth exceedeth all.

  21

  O Reino de Cambaia belicoso

  (Dizem que foi de Poro, Rei potente)

  O Reino de Narsinga, poderoso

  Mais de ouro e pedras que de forte gente.

  Aqui se enxerga lá do mar undoso

  Um monte alto, que corre longamente,

  Servindo ao Malabar de forte muro,

  Com que do Canará vive seguro.

  The sovranty of bellicose Cambay, 21

  (men say ’twas puissant Porus’ olden reign);

  Narsinga’s Kingdom, with her rich display

  of gold and gems but poor in martial vein:

  Here seen yonside where wavy waters play

  a range of mountains skirts the murmuring Main,

  serving the Malabar for mighty mure,

  who thus from him of Canara dwells secure.

  22

  Da terra os naturais lhe chamam Gate,

  Do pé do qual pequena quantidade

  Se estende uma fralda estreita, que combate

  Do mar a natural ferocidade.

  Aqui de outras cidades, sem debate,

  Calecu tem a ilustre dignidade

  De cabeça de Império rica e bela:

  Samorim se intitula o senhor dela.

  The country-people call this range the Ghaut, 22

  and from its foot-hills scanty breadth there be

  whose seaward-sloping coast-plain long hath fought

  ‘gainst Ocean’s natural ferocity:

 
Here o’er her neighbour Cities, sans a doubt,

  Calecut claimeth highest dignity,

  crown of the kingdom fair and flourishing:

  Here he entitled “Samorim” is King.

  23

  Chegada a frota ao rico senhorio,

  Um Português mandado logo parte

  A fazer sabedor o Rei gentio

  Da vinda sua a tão remota parte.

  Entrando o mensageiro pelo rio,

  Que ali nas ondas entra, a não vista arte,

  A cor, o gesto estranho, o trajo novo

  Fez concorrer a vê-lo todo o povo.

  Arrived the Squadron off that wealthy land, 23

  she sent a Portingall to make report,

  so mote the Gentoo monarch understand

  who hath arrived in his distant port:

  A stream the Herald struck which, leaving land

  entereth Ocean; and his novel sort,

  his hue, his strange attire, his stranger-ways

  made all the lieges gather round to gaze.

  24

  Entre a gente que a vê-lo concorria,

  Se chega um Mahometa, que nascido

  Fora na região da Berberia,

  Lá onde fora Anteu obedecido:

  Ou pela vizinhança já teria

  O Reino Lusitano conhecido,

  Ou foi já assinalado de seu ferro:

  Fortuna o trouxe a tão loiro desterro.

  Amid the swarming rout that thronged to view, 24

  cometh a Moslem, who was born and bred

  in distant Barb’ary ‘mid her barbarous crew,

  there, where in antient day Antaeus sway’d:

  Right well the Lusitanian realm he knew,

  or by the scanty distance thither led,

  or ‘signed by the Sword and Fortune’s brand,

  to long-drawn exile in a foreign land.

  25

  Em vendo o mensageiro, com jocundo

  Rosto, como quem sabe a língua Hispana,

  Lhe disse: “Quem te trouxe a estoutro mundo,

  Tão longe da tua pátria Lusitana?”

  — “Abrindo, lhe responde, o mar profundo,

  Por onde nunca veio gente humana,

  Vimos buscar do Indo a grão corrente,

  Por onde a Lei divina se acrescente.”

  With jocund mien our Messenger to sound, 25

  for-that he speaketh well the speech of Spain,

  he thus:—” Who brought thee to this new world’s bound,

  far from thy Fatherland, the Lusitan?”

  “Op’ening,” respondeth he, “the seas profound

  which never opened the race of man;

  for Indus’ mighty flood we hither bore,

  to win for Holy Faith one triumph more.”

  26

  Espantado ficou da grã viagem

  O Mouro, que Monçaide se chamava,

  Ouvindo as opressões que na passagem

  Do mar, o Lusitano lhe contava:

  Mas vendo enfim que a f orça da mensagem

  Só para o Rei da terra relevava,

  Lhe diz que estava f ora da cidade,

  Mas de caminho pouca quantidade.

  By the long voyage sore astonied stood 26

  the Moor Monsayde, thus his name was known;

  when told the Lusian how the terr’ible flood

  had all the temper of a tyrant shown:

  But, as that errand’s drift, he understood,

  concern’d the Ruler of the Land alone,

  he tells the stranger how the Monarch lay

  outside the city at a little way:

  27

  E que, entanto que a nova lhe chegasse

  De sua estranha vinda, se queria,

  Na sua pobre casa repousasse,

  E do manjar da terra comeria,

  E depois que se um pouco recreasse,

  Com ele para a armada tornaria,

  Que alegria não pode ser tamanha,

  Que achar gente vizinha em terra estranha.

  And that while travelled to the royal ear 27

  news of that advent strange, if judged he meet,

  repairing to his humble dwelling near,

  ‘twere well refreshment of the land to eat;

  whence by short rest restored and good cheer,

  the twain together might regain the Fleet;

  for life has nothing like the joy and glee

  wherewith near neighbours meet in far countrie.

  28

  O Português aceita de vontade

  O que o ledo Monçaide lhe oferece;

  Como se longa fora já a amizade,

  Com ele come, e bebe, e lhe obedece.

  Ambos se tornam logo da cidade

  Para a frota, que o Mouro bem conhece;

  Sobem à capitania; e toda a gente

  Monçaide recebeu benignamente.

  The Portingall, accepting not ingrate 28

  what glad Monsayde for his guest deviseth;

  as though their friendship were of olden date,

  eats, drinks, and does whate’er the host adviseth:

  Now from the City wend they, making straight

  towards the Squadron which the Moor agniseth;

  and scale the Flagship’s flank, where all the crew

  with kindly glances Moor Monsaydé view.

  29

  O Capitão o abraça em cabo ledo,

  Ouvindo clara a língua de Castela;

  Junto de si o assenta, e pronto e quedo,

  Pela terra pergunta, e cousas dela.

  Qual se ajuntava em Ródope o arvoredo,

  Só por ouvir o amante da donzela

  Eurídice, tocando a lira de ouro,

  Tal a gente se ajunta a ouvir o Mouro.

  Embraceth him our Chief, whom hugely please 29

  the well-remembered accents of Castile;

  seateth him near, and asketh him at ease

  anent the land and folk therein that dwell.

  Even as flockt on Rhodopé the trees,

  to hear the Lover of the Damosel

  Eurydice, his lyre of gold resound,

  the Folk to hearken flockt the Moor around.

  30

  Ele começa: “Ó gente, que a natura

  Vizinha fez de meu paterno ninho,

  Que destino tão grande ou que ventura

  Vos trouxe a cometerdes tal caminho?

  Não é sem causa, não, oculta e escura,

  Vir do longínquo Tejo e ignoto Minho,

  Por mares nunca doutro lenho arados,

  A Reinos tão remotos e apartados.

  Then he: “O Nation! who by Nature’s hand 30

  was ‘stablished neighbour to my natal nide,

  what mighty Chance, what Destiny’s command

  upon such voyage drave you far and wide?

  Not causeless, no; though darkly, deeply plan’d

  from unknown Minho, distant Tagus-tide,

  your course o’er Oceans aye by keel unplow’d

  to Reigns such distance and such dangers shroud.

  31

  “Deus por certo vos traz, porque pretende

  Algum serviço seu por vós obrado;

  Por isso só vos guia, e vos defende

  Dos inimigos, do mar, do vento irado.

  Sabei que estais na Índia, onde se estende

  Diverso povo, rico e prosperado

  De ouro luzente e fina pedraria,

  Cheiro suave, ardente especiaria.

  “God bringeth you, pardie! for He intendeth 31

  some special service which your works await:

  For this alone He guideth and defendeth

  from en’emies, Ocean and the winds’ wild hate.

  Know, that ye look on Inde wherein extendeth

  a world of nations, rich and fortunate

  in lucent gold, and gems of princely price,

  and odorif’erous fumes and biting spice.

  32

  “Esta província, cujo porto agora
r />   Tomado tendes, Malabar se chama:

  Do culto antigo os ídolos adora,

  Que cá por estas partes se derrama:

  De diversos Reis é, mas dum só

  Noutro tempo, segundo a antiga fama;

  Saramá Perimal foi derradeiro

  Rei, que este Reino teve unido e inteiro.

  “This Province, in whose Port your ships have tane 32

  refuge, the Malabar by name is known;

  its antique rite adoreth idols vain,

  Idol-religion being broadest sown:

  Of divers Kings it is; but ’twas the Reign,

  as olden legend saith, of only one,

  hight the last King was Sarma Perimal,

  who ‘neath one sceptre held the Kingdom all.

  33

  “Porém, como a esta terra então viessem

  De lá do seio Arábico outras gentes,

  Que o culto Mahomético trouxessem,

  No qual me instituíram meus parentes,

  Sucedeu que pregando convertessem

  O Perimal: de sábios e eloquentes,

  Fazem-lhe a lei tomar com fervor tanto,

  Que pressupôs de nela morrer santo.

  “But as this region there and then was sought 33

  by other races from the Arab Bight,

  who Mahometic worship with them brought, —

  the same my parents planted in my sprite, —

  it hapt their wisdom and their pray’ers so wrought

  upon the Perimal; and lit such light

  that to the Faith convert with fervour high,

  he only hoped a Saint in it to die.

  34

  “Naus arma, e nelas mete curioso

  Mercadoria, que ofereça rica,

  Para ir nelas a ser religioso,

  Onde o profeta jaz, que a Lei publica;

  Antes que parta, o Reino poderoso

  Com os seus reparte, porque não lhe fica

  Herdeiro próprio, faz os mais aceitos

  Ricos de pobres, livres de sujeitos.

  “He mans his ships and loads with merchandise 34

  and many an offering curious, rare and rich,

  and there religious life to lead he hies

  where lies our Prophet who our Law did preach:

  But ere abandon’d home, his satrapies,

  that lacked lawful heir, he parts to each

  and all he loved: Hence his intimates he

  from want made wealthy, and from serfdom free.

  35

  “A um Cochim, e a outro Cananor,

  A qual Chalé, a qual a ilha da Pimenta,

  A qual Coulão, a qual dá Cranganor,

  E os mais, a quem o mais serve e contenta,

  Um só moço, a quem tinha muito amor,

  Depois que tudo deu, se lhe apresenta:

  Para este Calecu somente fica,

  Cidade já por trato nobre e rica.

  “To this Cochim, to that falls Cananor, 35

  one hath Chale, another th’ Isle Piment,

  a third Coulam, a fourth takes Cranganor,

 

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