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O Grande Gatsby (Penguin)

Page 15

by F. Scott Fitzgerald


  James Gatz — era esse o seu nome verdadeiro, ao menos oficialmente. Ele decidira mudá-lo aos dezessete anos, no momento específico que marcava o início de sua carreira — quando viu o iate de Dan Cody baixar âncora na parte mais traiçoeiramente rasa do lago Superior. Era James Gatz que perambulava na praia aquela tarde, metido num blusão verde rasgado e calça de brim, mas foi Jay Gatsby que pediu um bote emprestado, encostou no Tuolomee e informou Cody que uma ventania iria apanhá-lo e destroçá-lo dali a meia hora.

  Suponho que ele já tinha escolhido o nome havia tempos, mesmo então. Seus pais eram fazendeiros preguiçosos e fracassados — sua imaginação nunca os reconhecera como pais. A verdade era que Jay Gatsby de West Egg, Long Island, havia saído da própria concepção platônica de si mesmo. Ele era um filho de Deus — frase que, se de fato significava alguma coisa, era exatamente isso — e devia ocupar-se dos negócios de seu Pai,a a serviço de uma beleza vasta, vulgar e libertina. Então ele inventou precisamente o Jay Gatsby que um menino de dezessete anos seria capaz de inventar, e foi fiel a essa concepção até o fim.

  Por mais de um ano ele vagou pela costa sul do lago Superior como catador de conchas e pescador de salmão, ou qualquer outra ocupação que lhe proporcionasse comida e lugar para dormir. Seu corpo moreno e calejado suportava naturalmente aqueles dias intensos de trabalho, meio brutais, meio preguiçosos. Gatsby conheceu as mulheres muito cedo, mas elas o mimaram e por isso ele se tornou desdenhoso — das moças virgens porque eram ignorantes e das outras porque ficavam histéricas com coisas que ele, em seu egocentrismo avassalador, tomava como certas.

  Mas seu coração vivia em uma turbulência constante. As ideias mais grotescas e fantásticas o perseguiam à noite, antes de dormir. Um universo de ostentação inefável se formava em sua mente enquanto os ponteiros do relógio avançavam no lavatório e a lua banhava de luz úmida suas roupas bagunçadas no chão. Todas as noites ele acrescentava algo à estrutura de suas fantasias até que a sonolência soterrasse essa cena vívida num abraço de esquecimento. Por um tempo, as ilusões lhe propiciaram um escape para a imaginação; eram uma alusão satisfatória à irrealidade da realidade, uma promessa de que a rocha do mundo estava assentada numa asa de fada.

  Um pressentimento de glória futura o levara, meses antes, ao pequeno Colégio Luterano de St. Olaf, ao sul de Minnesota.b Ele passou duas semanas lá, consternado com a feroz indiferença dos professores ao seu destino estrondoso, ou mesmo ao próprio destino, e acabou por desdenhar o trabalho de zelador com o qual pagaria sua matrícula. Então se deixou levar de volta ao lago Superior, e ainda procurava uma ocupação no dia em que o iate de Dan Cody baixou âncora na área mais rasa da costa.

  Cody tinha cinquenta anos e era um subproduto das jazidas de prata do Yukon, tendo participado de todas as corridas de metal desde 1875. Os negócios com o cobre de Montana que o tornaram várias vezes milionário o deixaram ainda fisicamente robusto, mas à beira da debilidade e, com isso em mente, um número infinito de mulheres tentou apartá-lo do dinheiro. As circunstâncias nada agradáveis pelas quais a jornalista Ella Kaye conseguiu dar uma de madame de Maintenon2 diante de suas fraquezas, despachando-o para o mar num iate, eram comuns na imprensa sensacionalista de 1902. Nos últimos cinco anos de vida, ele velejara por todo canto minimamente hospitaleiro da costa, antes de transformar a vida de James Gatz na baía de Little Girl.

  Para o jovem Gatz, descansando sobre os remos e admirando o parapeito do convés, o iate representava toda a beleza e glamour do mundo. Acredito que ele tenha sorrido para Cody — talvez já tivesse descoberto que as pessoas gostavam dele quando sorria. Em todo caso, Cody lhe fizera algumas perguntas (uma delas trouxe à tona seu novo nome) e descobriu que era um rapaz esperto e extravagantemente ambicioso. Poucos dias depois, levou-o a Duluth e comprou-lhe um sobretudo azul, seis pares de calças de brim e um quepe de iatismo. E quando o Toulomee zarpou para as Índias Ocidentais e a Costa da Berbéria,c Gatsby foi junto.

  Haviam-no alocado para uma função vaga e pessoal — enquanto esteve com Cody, foi comissário de bordo, imediato, capitão, secretário e até carcereiro, pois o Dan Cody sóbrio sabia quanta prodigalidade o Dan Cody bêbado podia cometer, e precavia-se dessas eventualidades depositando mais e mais confiança em Gatsby. O arranjo durou cinco anos, durante os quais o barco deu três voltas pelo continente. Teria durado eternamente, não fosse o fato de que Ella Kaye subiu a bordo certa noite, em Boston, e uma semana depois Dan Cody morreu de maneira inóspita.

  Lembro-me de seu retrato no quarto de Gatsby: um homem grisalho e ruborizado com um rosto duro e vazio — o típico pioneiro libertino, que no passado trouxera de volta à Costa Leste a violência selvagem dos saloons e bordéis da fronteira. Era indiretamente por sua causa que Gatsby bebia tão pouco. Às vezes, em festas animadas, as mulheres esfregavam champanhe em seu cabelo; de sua parte, Gatsby adquiriu o hábito de deixar a bebida em paz.

  E foi de Cody que ele herdou uma grande riqueza — um legado de vinte e cinco mil dólares que jamais chegou a receber. Nunca pôde entender os artifícios legais usados contra ele, mas o que sobrou dos milhões de Cody foi inteiramente para Ella Kaye. A ele restou apenas uma educação singularmente refinada; o vago contorno de Jay Gatsby fora agora preenchido pela substancialidade de um homem.

  Gatsby me contou tudo isso bem mais tarde, mas decidi registrá-lo aqui para desfazer aqueles primeiros e loucos rumores sobre seu passado, que não eram nem minimamente verdadeiros. Além disso, ele me contou sua história num momento de confusão, quando estive a ponto de acreditar em nada e em tudo a seu respeito. Então aproveitei essa breve pausa enquanto Gatsby, por assim dizer, retomava seu fôlego, para esclarecer essa série de mal-entendidos.

  Foi também uma pausa em meu envolvimento com seus problemas. Por várias semanas, não o vi nem ouvi sua voz ao telefone — passei a maior parte do tempo em Nova York, flanando com Jordan e tentando agradar a sua tia senil —, mas por fim, num domingo à tarde, resolvi passar em sua casa. Havia chegado fazia não mais que dois minutos quando um homem trouxe Tom Buchanan para tomar um drinque. Fiquei alarmado, é claro, mas o que me surpreendeu é que não houvesse acontecido antes.

  Eram três pessoas e estavam a cavalo — Tom, um homem chamado Sloane e uma bela mulher em trajes marrons de ginete, que já estivera lá.

  — É um prazer recebê-los — disse Gatsby, parado no pórtico. — Fico feliz com a visita.

  Como se eles se importassem!

  — Venham, sentem-se. Aceitam um cigarro ou charuto? — Andou rapidamente pela sala, tocando sinetas. — Trarei algo para vocês beberem em um minuto.

  Ele estava profundamente afetado com a presença de Tom. Mas, em todo caso, não sossegaria até arrumar uma bebida para os convidados, presumindo de forma vaga que eles haviam vindo para isso. O sr. Sloane dispensou a bebida. Uma limonada? Não, obrigado. Um pouco de champanhe? Não quero nada, obrigado… Me desculpe…

  — Fizeram um bom passeio?

  — Há belas trilhas por aqui.

  — Na certa os automóveis…

  — É.

  Movido por um impulso irresistível, Gatsby voltou-se para Tom, que havia sido apresentado como um estranho.

  — Acho que já nos conhecemos, senhor Buchanan.

  — Ah, sim — disse Tom num jeito rispidamente educado, mas era óbvio que não se lembrava. — É verdade. Lembro-me muito bem.

  — Há mais ou menos duas semanas.

  — Claro. Você estava com Nick.

  — Conheço sua esposa — continuou Gatsby, de modo quase agressivo.

  — É mesmo?

  Tom virou-se para mim.

  — Você mora por aqui, Nick?

  — Na casa ao lado.

  — É mesmo?

  O sr. Sloane não participou da conversa e continuou largado desdenhosamente em sua poltrona; a mulher também não disse uma palavra — até que, de repente, após dois uísques com soda, se fez simpática.

  — Nós todos iremos comparecer a sua próxima festa, senhor Gatsby — ela sugeriu. — O que me diz?


  — Ótimo, será um prazer recebê-los.

  — Que bom — disse o sr. Sloane, sem demonstrar gratidão. — Bem, acho que é hora de irmos para casa.

  — Por favor, não se apressem — Gatsby os encorajou. Ele agora assumira o controle de si mesmo e gostaria de saber mais sobre Tom. — Por que vocês não… por que não ficam para o jantar? Não seria nenhuma surpresa se aparecesse por aqui mais gente de Nova York.

  — Você venha jantar comigo — disse a moça com entusiasmo. — Vocês dois.

  Aquilo me incluía. O sr. Sloane levantou-se.

  — Vamos — ele disse, dirigindo-se apenas à esposa.

  — É sério — ela insistiu. — Adoraria tê-los em casa. Temos bastante espaço.

  Gatsby olhou para mim interrogativamente. Ele queria ir, mas não tinha reparado que o sr. Sloane já decidira em contrário.

  — Acho que não vou poder ir — eu disse.

  — Bem, então venha você — ela pediu, concentrando-se em Gatsby.

  O sr. Sloane sussurrou alguma coisa ao pé do seu ouvido.

  — Não ficará tarde se sairmos agora — ela insistiu, em voz alta.

  — Não tenho cavalo — respondeu Gatsby. — Costumava montar na época do Exército, mas nunca cheguei a comprar um. Terei que segui-los em meu carro. Com licença, volto em um minuto.

  Fomos sem Gatsby até o pórtico, onde Sloane e a mulher começaram uma discussão inflamada.

  — Meu Deus, e não é que o homem vai mesmo? — exclamou Tom. — Será que não percebe que ela não quer que vá?

  — Mas ela disse que quer.

  — Haverá um grande jantar festivo e ele não conhece ninguém. — Tom franziu as sobrancelhas. — Fico imaginando de onde diabos ele conhece Daisy. Por Deus, posso ter ideias antiquadas, mas as mulheres de hoje em dia circulam demais para o meu gosto. Elas acabam conhecendo todo tipo de gente esquisita.

  De súbito, o sr. Sloane e a mulher desceram os degraus e montaram seus cavalos.

  — Vamos — disse o sr. Sloane para Tom —, estamos atrasados. Temos que ir.

  E então, para mim:

  — Diga a ele que não pudemos esperar, certo?

  Tom e eu nos cumprimentamos, troquei um aceno indiferente com os outros dois e eles trotaram às pressas pela entrada da casa, desaparecendo sob a folhagem de agosto no exato instante em que Gatsby surgia à porta de chapéu e casaco leve.

  Tom ficara claramente incomodado com as andanças solitárias de Daisy, pois no sábado seguinte ele a acompanhou à festa de Gatsby. Talvez sua presença tenha conferido àquela noite um caráter singularmente opressivo — destacando-se em minha memória das outras festas de Gatsby naquele verão. Eram os mesmos convidados, ou pelo menos o mesmo tipo de convidados, a mesma profusão de champanhe, a mesma comoção colorida e dissonante, mas havia um desconforto no ar, uma aridez penetrante que nunca esteve lá. Ou talvez eu tenha me habituado às festas e passado a aceitar West Egg como um mundo em si mesmo com suas próprias regras e celebridades, sem nada que lhe fizesse frente, pois era tudo involuntário. E agora me via forçado a analisar tudo de novo, através dos olhos de Daisy. É invariavelmente triste ver com novos olhos situações às quais você já havia despendido esforços para se ajustar.

  Eles chegaram ao anoitecer e, enquanto passeávamos entre centenas de convidados entusiasmados, Daisy cantarolava baixinho.

  — Essas coisas me deixam tão animada — ela sussurrou. — Se quiser me beijar em algum momento, Nick, é só dizer e ficarei feliz em atendê-lo. Basta chamar o meu nome. Ou me apresentar um cartão verde. Estou distribuindo cartões…

  — Olhe bem à sua volta — sugeriu Gatsby.

  — Estou olhando. É uma noite marav…

  — Você precisa ver o rosto de todas essas pessoas de quem já ouviu falar.

  Os olhos arrogantes de Tom perscrutaram a multidão.

  — Não costumamos sair muito de casa — ele disse. — Na verdade, eu estava justamente pensando que não conheço uma única alma aqui dentro.

  — Talvez conheça aquela moça. — Gatsby apontou para uma mulher estonteante que mais parecia uma orquídea, dificilmente humana, sentada com pompa sob uma ameixeira branca. Tom e Daisy olharam com aquela sensação irreal que temos ao reconhecer alguma celebridade do cinema, até então etérea.

  — Ela é linda — disse Daisy.

  — O homem inclinado sobre ela é seu diretor.

  Ele os conduziu cerimoniosamente de grupo em grupo:

  — Senhora Buchanan… e senhor Buchanan… — Após um instante de hesitação, ele acrescentou: — O jogador de polo.

  — Ah, não — protestou Tom imediatamente —, de maneira alguma.

  Mas era óbvio que aquela alcunha agradava a Gatsby, de modo que Tom permaneceu “o jogador de polo” pelo resto da noite.

  — Nunca vi tantas celebridades — exclamou Daisy. — Gostei daquele homem — como se chama mesmo? —, aquele com o nariz azulado.

  Gatsby o identificou, informando que era um pequeno produtor.

  — Bem, em todo caso gostei dele.

  — Eu realmente preferia não ser o jogador de polo — disse Tom amigavelmente. — Gostaria de poder olhar para todas essas pessoas famosas do alto de meu… de meu anonimato.

  Daisy e Gatsby foram dançar. Lembro-me de ficar surpreso com seu jeito altivo e conservador de bailar o foxtrote — eu nunca o tinha visto dançar. Então eles caminharam até a minha casa e passaram meia hora sentados nos degraus, enquanto, a pedido de Daisy, eu permanecia de vigia no jardim.

  — Para o caso de haver um incêndio ou uma inundação — ela explicou —, ou qualquer outro ato da natureza.

  Tom retornou de seu anonimato quando nos organizávamos para o jantar.

  — Vocês se importam se eu me sentar com aquela turma logo ali? — ele perguntou. — Tem um sujeito contando umas histórias muito engraçadas.

  — Vá em frente — respondeu Daisy com alegria —, e se quiser anotar algum telefone, aqui está o meu lápis dourado…

  Após um instante, ela olhou para trás e me contou que a garota era “comum, mas bonita”, e eu percebi que, excetuando-se aquela meia hora que passara a sós com Gatsby, ela não estava se divertindo.

  Havíamos escolhido uma mesa particularmente bêbada. A culpa era minha — Gatsby saíra para atender o telefone e eu havia me divertido com essas mesmas pessoas duas semanas antes. Mas o que outrora me entusiasmara agora apodrecia em pleno ar.

  — Está se sentindo bem, senhorita Baedeker?

  A referida garota tentava, sem sucesso, tombar sobre o meu ombro. Diante da pergunta, ela se aprumou e abriu os olhos.

  — Ahn?

  Uma mulher robusta e letárgica, que até então tentava convencer Daisy a jogar golfe com ela no clube, falou em defesa da srta. Baedeker:

  — Ah, ela está bem agora. Quando toma uns cinco ou seis coquetéis, costuma gritar desse jeito. Eu sempre falo para ela parar de beber.

  — Eu parei de beber — afirmou a acusada, só por falar.

  — Todo mundo ouviu os seus gritos, então eu disse para o doutor Civet: “Alguém aqui precisa da sua ajuda, doutor”.

  — Ela ficou muito agradecida, tenho certeza — disse outro amigo, sem um pingo de gratidão —, mas você lhe molhou todo o vestido ao meter a cabeça dela na piscina.

  — Se tem uma coisa que eu odeio é meterem a minha cabeça na piscina — balbuciou a srta. Baedeker. — Uma vez, em Nova Jersey, quase me afogaram.

  — Então você devia parar de beber — retrucou o dr. Civet.

  — Olha quem está falando! — gritou a srta. Baedeker agressivamente. — A sua mão está tremendo. Eu nunca deixaria você me operar!

  E assim por diante. A última lembrança que tenho foi de estar com Daisy observando o diretor de cinema e sua estrela. Eles continuavam sentados sob a ameixeira branca e seus rostos quase se roçavam, separados apenas por um pálido e tênue fio de luar. Ocorreu-me que ele passara a noite toda se debruçando em sua direção só para alcançar essa proximidade, e, enquanto eu o observava, venceu o último
degrau e a beijou na bochecha.

  — Eu gosto dela — disse Daisy —, é muito encantadora.

  Mas o resto da festa lhe desagradava — e não havia o que discutir, já que não se tratava de gestos, mas de emoções. Daisy estava chocada com West Egg, esse lugarzinho inaudito que a Broadway havia engendrado num vilarejo de pescadores de Long Island —, chocada com o vigor brutal que se ocultava por trás dos velhos eufemismos e com o destino absolutamente importuno que forçava os moradores a viver nessa espécie de atalho que levava de nada a lugar algum. Ela via naquela simplicidade algo terrível que não conseguia explicar.

  Sentei-me ao lado de Tom e Daisy nos degraus, enquanto eles esperavam o carro. A frente da casa era um verdadeiro breu; a luz da porta projetava apenas um minúsculo retângulo sobre a branda e escura madrugada. Às vezes uma sombra se mexia por trás da veneziana de algum quarto de vestir, dando lugar a outra sombra e a uma infinita sucessão delas, que passavam rouge e pó de arroz diante de um espelho invisível.

  — Afinal, quem é esse Gatsby? — perguntou Tom de repente. — Algum figurão contrabandista?

  — Onde você ouviu isso? — perguntei.

  — Em lugar nenhum. Eu presumi. Você sabe que muitos desses novos-ricos não passam de contrabandistas.

  — Não o Gatsby — eu disse, sucinto.

  Ele ficou calado por um instante. Esmagou com o pé uns pedregulhos da entrada da casa.

  — Bem, ele deve ter se desdobrado para juntar essa turma exótica.

  Uma brisa soprava a névoa cinzenta da gola de pele do casaco de Daisy.

  — Pelo menos são mais interessantes do que as pessoas que nós conhecemos — ela disse, com esforço.

  — Você não parecia tão interessada.

  — Mas estava.

  Tom deu risada e voltou-se para mim.

  — Você reparou na cara que Daisy fez quando aquela moça lhe pediu que a metessem debaixo do chuveiro?

  Daisy resolveu acompanhar a música com um sussurro rouco e melodioso, conferindo às palavras um novo sentido, que jamais tiveram e nunca mais terão. Quando a música se erguia, a voz de Daisy irrompia docemente em seu encalço, como fazem as vozes de contralto, e cada mudança de tom exalava no ar um pouco de sua magia cálida e humana.

 

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